A greve acabou. Impossível não tirarmos lições do movimento, já que mexeu com o país em vários aspectos. Em uma análise fria, poderíamos pensar numa simples revolta de uma categoria que tem sido execrada, pois na cadeia produtiva e de logística são essenciais, entre outras coisas, pela falta de estrutura e outros meios de transportes tão imprescindíveis ao país.
Mas quero neste texto discutir as consequências do movimento e o alerta advindos dele na sociedade em geral e no meio político. Fora o oportunismo dos grandes conglomerados no segmento de transporte, cujos objetivos destoavam dos irmãos autônomos, existe a análise de uma inquietude entre os cidadãos deste país. O Data Folha realizou uma pesquisa no auge do movimento, onde 87% apoiavam a greve, mas os mesmos 87% não aceitavam que os descontos no combustível viessem parar em seu bolso.
O apoio quase maciço representa também o anseio do trabalhador que gostaria de fazer um movimento parecido, mas não faz, por medo ou falta de quem os lidere. Na greve surgiram nos parabrisas dos caminhões, a expressão “INTERVENÇÃO JÁ”. Quando o assunto aparecia em uma roda de amigos, todos concordavam que deveria ocorrer a intervenção. Mas quando perguntados sobre as consequências da tal intervenção, a grande maioria dizia. “Ora, não é para tirar o Temer”? Respondia que sim, mas e dai por diante, o que aconteceria? Ninguém sabia muito o que responder. Quando informava que a intervenção poderia levar a uma eventual ditadura, o amigo assustava e dizia. “Igual de 64? Ai não”. Tive a impressão de que queriam tirar o Temer, mas pretendiam uma intervenção democrática. Outros diziam: “ Só quero que tirem o homem e antecipem as eleições”, mas quando perguntados sobre os candidatos que aí estão, se algum deles lhes enchiam de orgulho e os representava politicamente, se adiantavam em dizer que não.
Frisavam que as opções são pífias e não acreditam que haja possibilidade de mudar o país e tirá-lo desse estado de coisas em que estamos atolados. Outro aspecto que devemos analisar é que desde junho de 2013, quando houve os movimentos que levaram milhares às ruas, momentos em que tivemos a quase certeza de que o Brasil não seria mais o mesmo, (pois dele se desprendeu a derrubada da Dilma e até mesmo o pontapé inicial para a Lava Jato), essa greve nos trouxe um lampejo de esperança.
Mas precisamos de algumas reflexões. É muito bom discutirmos o movimento à distância, desde que não mexa comigo e com o meu bolso. Aplaudimos quando alguém se dispõe a ficar 10 dias à beira de uma estrada e longe da família, mas não conte comigo, pois prefiro o aconchego do meu lar. Queremos a intervenção já, mas sequer sabemos ou temos condições de discutir como se dará isso e suas consequências. Queremos depor o presidente e até a antecipação das eleições, mas não sabemos sequer em quem votar e não confiamos nos candidatos que aí estão.
Na pesquisa, a grande maioria votou em apoio à greve. Responder pesquisa não requer esforço, dispêndio financeiro e muito menos envolvimento que possa nos comprometer, mas as coisas que almejamos para nós e para o país não se conseguem apenas respondendo a um questionário. O Brasil precisa de muito mais. Não apenas de mudanças de regime politico, precisamos honrar nosso compromisso conosco mesmos, com o povo brasileiro e com o país.
Percival Pretti
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